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O Solfejo do Objeto Sonoro – 11

SCHAEFFER, Pierre & Guy Reibel. Solfège de l’Objet Sonore. Paris: Editions du Seuil, 1966. (tradução portuguesa de António de Sousa Dias, 2007).

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CD 2 45     22 notas sobre as 7 oitavas

Após os critérios dinâmicos, passemos em seguida aos critérios harmónicos. Quais são as suas variações em função do registo? Para as constatar, transporemos, no gravador, um ré grave [ré1], duas oitavas acima, e comparemo-lo com o som natural do piano sobre a mesma nota. Eis o ré grave:

 


CD 2 46     ré1 de piano

E agora, este ré transposto duas oitavas acima, comparado com o som de piano à mesma altura:

 


CD 2 47     exemplo 46 transposto 2 oitavas acima, depois a mesma nota no teclado (ré3)

Parece evidente que o timbre harmónico do ré grave, ao qual não adulterámos o conteúdo, pois que todo o espectro foi igualmente deslocado duas oitavas acima, é muito mais rico que o som natural. Realizemos em seguida a experiência simétrica, tomando um ré agudo [ré5]:

 


CD 2 48     ré5 do piano

transponhamo-lo, sem o desnaturar, duas oitavas mais baixo, graças ao ralenti do gravador. O espectro é evidentemente mais pobre que o da nota original sobre a mesma altura:

 


CD 2 49     exemplo 48 transposto 2 oitavas abaixo, seguido da mesma nota ao teclado [ré3]

A conclusão é óbvia, mesmo se paradoxal: o timbre harmónico [1] é não apenas mais rico, mas também mais claro para o registo grave, e [2] é mais pobre e mais sombrio para o registo agudo. Confirmemos esta constatação, repetindo a mesma experiência sobre um grupo melódico; eis aqui a melodia original:

 


CD 2 50     melodia ao piano

Duas oitavas acima o seu timbre é mais rico que as notas da mesma altura:

 


CD 2 51     melodia do exemplo 50 transposta, num gravador de velocidade variável, 2 oitavas acima, seguida da mesma tocada ao piano

Duas oitavas abaixo, o timbre é menos rico que as notas na mesma altura:

 


CD 2 52     idem, 2 oitavas abaixo

Quarta ideia: Lei do piano.
Podemos então dizer que o piano é governado por uma lei de compensação entre timbre harmónico e timbre dinâmico. Considerando uma progressão do grave até ao agudo, se a inclinação da curva dinâmica cresce constantemente, a riqueza harmónica decresce proporcionalmente. Podemos verificar esta hipótese tomando do próprio piano os seus elementos de síntese. Ao percutirmos com um plectro uma nota média, um dó2 por exemplo, obteremos um som simultaneamente mais rico e mais abrupto que o original:

 


CD 2 53     dó2 de piano percutido com plectro

Transposto uma oitava abaixo, ele mantém a sua riqueza [harmónica], mas a sua curva[dinâmica] é atenuada, o que explica que se assemelhe à nota original dó1 da oitava inferior:

 


CD 2 54     exemplo 53 transposto uma oitava abaixo

Podemos da mesma maneira, operar uma transmutação da guitarra em “simili-piano”; a riqueza da guitarra corresponderá então à do registo grave do piano, e a inclinação será restituída graças a um corte sobre um ponto da dinâmica, correspondente à da nota do piano procurada. Eis aqui a guitarra seguida da sua simulação de piano:

 


CD 2 55     pizz de guitarra seguido do mesmo transposto 3 oitavas abaixo

Quinta ideia: O âmbito do timbre harmónico.
A noção de timbre harmónico não deve ser confundida com a noção, teórica, do espectro dos harmónicos superiores. Como iremos observar, os harmónicos inferiores, ou mais exactamente a ressonância harmónica do instrumento (a caixa de ressonância no caso do piano), têm um papel fundamental, determinando, para cada instrumento, uma zona [ou mais] de ressonância privilegiada. Assim, mesmo deixando passar os principais harmónicos de uma nota grave de piano (lá-1), cortando os harmónicos acima de 300 Hz, desnaturamos o timbre devido à supressão das ressonâncias agudas do instrumento:

 

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